El Hierro propôs converter-se na primeira ilha sustentável do mundo num prazo de entre quatro e oito anos. De momento, está no bom caminho.



Entre os dias 13 de julho e 7 de agosto de 2019, El Hierro voltou a bater um recorde em termos de energia: durante 24 dias seguidos, toda a sua população foi abastecida única e exclusivamente de energias renováveis, um recorde mundial em territórios insulares cujo abastecimento de energia está baseado habitualmente em combustíveis fósseis. Mas as suas ambições sustentáveis não ficam por aqui. El Hierro propôs ser energeticamente limpa e 100% autónoma num prazo de entre quatro e oito anos, tal como afirmou o seu presidente, Alpidio Armas.
A cruzada verde de El Hierro começou em 1997, quando a segunda mais pequena das Ilhas Canárias, depois de La Graciosa, Reserva da Biosfera da UNESCO desde o ano 2000, estabeleceu um Plano de Sustentabilidade que a situava muito à frente de iniciativas europeias e mundiais em aspetos como a autossuficiência energética, um modelo turístico respeitoso com o território, agricultura ecológica e políticas de resíduos zero. Em 2006 foi realizada uma revisão completa do plano, que concluiu que em dez anos 82% dos objetivos tinham sido cumpridos.
Um dos principais pilares desta estratégia foi a construção da central hidroeólica de Gorona del Viento, inaugurada no dia 27 de junho de 2014, que satisfaz perto de 60% das necessidades de eletricidade da ilha. O Parque Eólico, que está participado pelo Cabildo de El Hierro (o governo local da ilha), a companhia de energia Endesa, o Instituto Tecnológico das Canárias (ITC) e o Governo das Canárias, custou 82 milhões de euros, e foi construído na cratera esvaziada de um vulcão (El Hierro é a ilha com maior densidade de vulcões das Ilhas Canárias, com mais de 500 crateras a céu aberto), convertida no seu depósito superior de água. Por sua parte, os aerogeradores foram instalados nas colinas em que Valverde, a capital, se ergue, onde sempre há vento.
Graças a Gorona, em 2017 a ilha prescindiu de 6017 toneladas de diesel, equivalentes a 40 000 barris de petróleo, e converteu-se numa referência a nível mundial no desenvolvimento de energias renováveis. Desde 2015, além disso, as emissões de gases com efeito de estufa foram reduzidas em 40 000 toneladas. Para conseguir o seguinte objetivo, a plena autossuficiência e sustentabilidade energética, já se está a trabalhar numa ampliação da central, que consistirá na introdução de energia das ondas e fotovoltaica (com a instalação de painéis solares), e na utilização de baterias para acumular os excedentes de produção que não forem consumidos.
“Não se pode entender a ânsia de sustentabilidade de El Hierro, que emana diretamente dos seus habitantes, sem conhecer a história das Ilhas Canárias. Durante muito tempo, os seus habitantes viram-se obrigados a emigrar, muitos deles para a América Latina, e deu-se uma dispersão da população que na atualidade desembocou num apego ao território, e numa vontade unânime de conservação do património natural”, explica Gonzalo Piernavieja, diretor da divisão de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico do Instituto Tecnológico das Canárias (ITC), uma instituição que trabalha há mais de 20 anos na pesquisa de soluções tecnológicas para maximizar a penetração das energias renováveis nas Ilhas Canárias.
Gonzalo Piernavieja destaca adicionalmente que as Ilhas Canárias em geral e El Hierro em particular tiveram a possibilidade de se converterem em referências em questões de sustentabilidade graças, paradoxalmente, às particularidades do seu modelo turístico. “As Canárias são um território com 2,2 milhões de habitantes que acolhe todos os anos uns 15 milhões de turistas. Como é possível que com semelhantes valores possam ser sustentáveis? Muito simples. As Ilhas Canárias recebem turistas de forma escalonada durante o ano inteiro, de forma que não ocorrem avalanches no verão como nas Baleares ou noutros arquipélagos.” Isto significa que as maiores ilhas estão preparadas para receber cada mês uns 300 000 turistas, o que permite criar políticas de sustentabilidade que seriam impossíveis se este número se concentrasse em poucas semanas do ano.



Mobilidade sustentável
Gorona não é a única iniciativa que consolida El Hierro como uma referência na matéria. O Plano de Mobilidade Sustentável de El Hierro é um ambicioso projeto que estabelece como objetivos, entre outras medidas, aumentar a frequência e cobertura do transporte público, facilitar a informação sobre rotas e tarifas, melhorar o acesso para as pessoas idosas (calcula-se que representam cerca de 30% dos utentes), bem como criar um programa-piloto de carro partilhado entre os funcionários públicos com o objetivo de racionalizar o uso do transporte privado.
Outros aspetos contemplados nesta iniciativa são a redução das licenças de táxi, e o fomento do transporte público e dos táxis partilhados para chegar aos principais centros turísticos e de lazer (caminhos, atrações turísticas, centros de visitantes, praias, etc.). Inclui, adicionalmente, um plano detalhado para promover não só a utilização de microautocarros elétricos em determinadas áreas da ilha, mas também para renovar a sua frota automóvel, substituindo os veículos de combustão por veículos elétricos abastecidos através da central hidroeólica. Na atualidade, o Cabildo (o governo local da ilha) trabalha também num projeto para obter biodiesel a partir de óleos vegetais usados recolhidos na própria ilha.



Agricultura ecológica
Em janeiro de 2010, coincidindo com o décimo aniversário da declaração da ilha como Reserva da Biosfera, o Cabildo (o governo local da ilha) apresentou um documento em que se comprometia a que a ilha fosse 100 % ecológica e autossuficiente em matéria de agricultura, pecuária, pesca e alimentação no prazo de oito anos. De facto, há várias décadas que é uma referência em termos de produção ecológica de determinados culturas, como a banana. Sem ter alcançado a totalidade dos seus propósitos, El Hierro é, na atualidade, a ilha com maior superfície qualificada de produção ecológica, com 53 operadores registados e 4232 hectares (incluindo os pastos de La Dehesa).
Destaca-se também a sua firme aposta na permacultura, um sistema de design agrícola, social, político e económico baseado nos padrões e características do ecossistema natural, contando com diversos projetos neste âmbito. A Escola de Permacultura PapaGaia é um destes projetos, um lugar de encontro para todas as pessoas interessadas na vida sustentável, na agroecologia, no ecofeminismo e na arte.






Turismo sustentável
As suas paisagens vulcânicas de incrível beleza, as suas maravilhosas zonas de banho, o clima agradável durante o ano inteiro, e o encanto que emana de todos os recantos desta pequena e tranquila ilha, fazem de El Hierro um lugar único no mundo que atrai milhares de turistas todos os anos. Além disso, mergulhadores de todos os cantos do mundo chegam a El Hierro para mergulhar no Mar de Las Calmas, uma das três Reservas Marinhas existentes nas Ilhas Canárias, e noutros pontos da acidentada costa da ilha, de águas transparentes, multicolor flora marinha e uma fauna variada e única que inclui meros, viejas (vejas), moreias, peixes-trombeta, lagostas e mesmo jamantas e tubarões-baleia.





